A câmara externa de uma Autoclave pode ser utilizada como Gerador de Vapor?


A utilização da câmara externa como "gerador de vapor" me faz lembrar da primeira autoclave projetada em 1880 por Chamberland, onde o vapor era gerado, através de resistências elétricas e água, dentro da própria câmara interna. Apesar do conceito de esterilização a vapor saturado ser o mesmo desde aquela época, tivemos uma evolução nos critérios de aceitação para este tipo de processo visando garantir a esterilização, que não é um processo absoluto. A esterilização através de vapor saturado, para cargas secas, ocorre somente quando o vapor entra em contato com o material a ser processado, e sabemos hoje que a presença de gases não condensáveis e o título do vapor inadequado são barreiras neste processo. Comparando os projetos atuais com a primeira autoclave, temos as seguintes alterações introduzidas nas autoclaves atuais para aumentar a garantia do processo de esterilização:

a) gerador externo de vapor: tem como objetivo fornecer o vapor saturado, com pressão e volume constante, evitando o vapor super aquecido ou super saturado.
b) câmara externa envolvendo a câmara interna: normalmente mantida de 10% a 15% acima da pressão da câmara interna, tem como objetivo condicionar a temperatura das paredes internas da autoclave, evitando a condensação o vapor por diferencial de temperatura dentro da câmara interna, condensação esta que altera o título do vapor e prejudica a distribuição térmica dentro da câmara interna.
c) bomba de vácuo: Possui dois objetivos, remoção dos gases não condensáveis no início do ciclo e remoção do vapor, antes de sua condensação, ao término do ciclo.
d) controle microprocessado: Garantir que os tempos e temperatura de cada fase de esterilização estejam sempre dentro da faixa de operação pré estabelecida.
e) dispositivos de segurança: diversos componentes voltados para a segurança dos operadores.

Diante disto, a indicação de se utilizar a câmara externa como gerador de vapor irá impactar nos seguintes pontos:

1) Todo gerador de vapor, para garantir pressão e volume de fornecimento constantes, é dimensionado para trabalhar com uma pressão de 30% a 50% (irei adotar 3,0 Kgf/cm2 para exemplificar) maior que pressão da câmara externa, nos ciclos a uma temperatura de 134ºC, cuja pressão é de 2,2 Kgf/cm2. Por outro lado a câmara externa trabalha com uma pressão de 10% a 15% (irei adotar 2,4 Kgf/cm2 para exemplificar) acima da pressão da câmera interna. Usando a câmara externa como gerador de vapor temos um problema que não há como se resolver, pois para garantirmos a pressão e volume constante de fornecimento de vapor durante o ciclo de esterilização, teríamos que ter a câmara externa ajustada para trabalhar (usando os meus valores como exemplo) com 3,0 Kgf/cm2 de pressão e nesta condição teremos um efeito indesejável que é o de condução térmica da câmara externa para a câmara interna causando um aumentado descontrolado da temperatura dentro da câmara interna, interferindo no título do vapor. Por outro lado se a pressão da câmara externa for ajustada para 2,4 Kgf/cm2 teremos uma geração de vapor insuficiente, pois o diferencial de pressão é praticamente nulo, fazendo com que todo vapor gerado seja consumido pelo equipamento, aumentando a condensação por perdas térmicas, interferindo no título do vapor.
2) Outro agravante esta no objetivo de funcionamento da câmara externa. Como a sua função é de condicionar as paredes da câmara interna para evitar condensação do vapor por diferencial de temperatura, teremos neste sistema pelo menos ¼ da câmara externa a uma temperatura muito abaixo de 100ºC, pois para gerar vapor existe a necessidade de haver água, e esta também estará presente na câmara externa.
3) Como a câmara externa está sendo utilizada para gerar vapor, teremos um problema de excesso temperatura nos ciclos a 121ºC, cuja pressão é de 1,1 Kgf/cm2, pois mesmo que a pressão esteja ajustada para 2,4 Kgf/cm2 teremos uma condução térmica que irá aumentar a temperatura da câmara interna em 10ºC do ponto de controle. Mesmo que o equipamento controle a geração de vapor de acordo com a temperatura de operação, além do problema exposto no item anterior, haverá um problema de distribuição térmica quando um ciclo de 121ºC for realizado logo após um ciclo de 134ºC, pois não haverá a redução da pressão da câmara externa imediatamente, uma vez que está sendo utilizada como gerador de vapor.
4) Com a revogação da ABNT NBR ISO 11.134:2001, pela ABNT NBR ISO 17.665-1:2010, onde os critérios de aceitação para distribuição térmica e pressão deixaram de constar na norma, passando a "bola" para o usuário que irá validar o seu equipamento determinar estes critérios, e levando em consideração que estes valores não poderão ser adotados arbritariamente, serão adotados os critérios constantes em normas de validação mais recentes. Neste caso será a EN 285:2006, na qual além dos valores de variação de temperatura, ela também exige que seja calculada a temperatura de saturação do vapor, com base na pressão absoluta medida durante a fase de exposição, e que a diferença entre a temperatura medida e a calculada com base na pressão não poderá ser maior que 2ºC. Portanto, a configuração do gerador de vapor junto com a câmara externa, provavelmente não atenderá este requisito.